A diretora Institucional do Instituto Melhores Dias, Gabriela Pen Nasser está na cidade de Freiburg im Breisgau, na Alemanha, com a família, desde 2019, fazendo mestrado em Saúde Pública na Universidade de Freiburg.
A cidade tem cerca de 200 mil habitantes, sendo que quase 12 mil são ligados ao Hospital Universitário, um dos maiores e mais tradicionais da Alemanha (Universitäts Klinikum Freiburg). Fica no estado de Baden-Württemberg, no sul do país.
Freiburg é chamada “cidade-verde” pelos alemães por suas iniciativas voltadas para preservação do meio ambiente e por ter, em seu território, a “Floresta Negra”, área verde de grande reconhecimento na Alemanha.
Gabriela tem vivido essa pandemia dentro da realidade alemã, mas com os olhos voltados para o Brasil. De lá, ela nos envia um relato sobre como o país europeu vem enfrentando o coronavírus e sobre como ela tem recebido e analisado as notícias sobre o Covid-19 no Brasil.
Acompanhe a entrevista com nossa profissional:
IMD – Como a pandemia pegou vocês aí?
GABRIELA: A Alemanha foi um dos principais epicentros da pandemia na Europa, um dos primeiros países a ter casos depois da Itália. Em fevereiro, começaram a anunciar casos na Bavária (região vizinha daqui), mas pensava-se que era algo isolado, que ainda estava “longe”… De repente, foi uma explosão de casos incontrolável e o estado onde vivemos, Baden, é hoje o terceiro estado com mais casos na Alemanha (são 33.287 casos). A cidade de Freiburg foi muito afetada. Tudo parou por aqui: escolas, lojas, locais públicos fecharam bem na época em que o clima esquentou, quando geralmente todos vão para as ruas.
IMD – Qual foi a estratégia de isolamento social adotada aí?
GABRIELA: Dia 13 de março, a Alemanha fechou escolas e no dia 22 do mesmo mês iniciou o “lockdown”, porém não tão restrito como outros países como Itália e Espanha. Ainda podíamos sair de casa em família, e ir ao mercado e farmácia. O distanciamento social foi muito respeitado aqui, notou-se uma mudança efetiva a partir do momento que as decisões foram tomadas em nível nacional.
IMD – Você está faz quanto tempo em isolamento social?
GABRIELA: Desde o início de março. Na primeira semana desse mês, houve um caso de covid na escola do meu filho menor, então ela parou uma semana antes do que o fechamento oficial. Desde então, não saímos muito de casa, só para andar com o cachorro ou dar uma volta com as crianças.
IMD – Há uma previsão de termino do isolamento?
GABRIELA: A Alemanha está tentando sair do isolamento, desde o início de maio. Porém, estão notando uma alta no número de casos agora. Estão todos com muita cautela, as escolas voltaram parcialmente (para alunos mais velhos que tem que se preparar para o exame equivalente ao vestibular. Para as crianças menores, o planejamento é voltar parcialmente após o feriado de duas semanas que eles têm em junho aqui (após dia 14/06). Já avisaram os alunos que, provavelmente, abrirão uma semana, depois as crianças ficam duas em casa e depois mais uma… Desta forma, acredito que podem controlar o avanço dos casos. Tudo aqui é muito planejado e discutido. Acredito que as regras de isolamento social irão se manter.
IMD – Há uma boa atuação estatal na gestão da pandemia?
GABRIELA: Sim, a Alemanha é vista como modelo mundial. Não se sabe bem determinar a causa específica da fatalidade tão baixa aqui. Atribui-se ao número de testes, mas também ao sistema de saúde bem preparado. Há uma integração dos hospitais do país, eles fizeram uma plataforma com números de leitos disponíveis por hospital. A Uniklinik, aqui de Freiburg, recebeu pacientes de outros lugares da Alemanha e da França e Itália também. Além disso, a primeira chanceler alemã, Angela Merkel, tem uma postura respeitada, ela e a equipe souberam agir de maneira eficaz na hora certa.
IMD – Como enxerga à distância gestão da pandemia no Brasil?
GABRIELA: A forma como o Brasil está aparecendo nos noticiários por aqui é de um desrespeito às medidas tomadas mundialmente, uma falta de preparo. Agora que o Brasil está entrando em um momento difícil da pandemia com um número alto de casos, o país parece um corpo que anda sozinho sem uma cabeça. É preciso lidar com as crises da saúde interligando com outros setores e, principalmente, na escala que estamos vendo hoje, com uma liderança que esteja de acordo com normas mundiais para tomar decisões acertadas e servir de exemplo.
IMD – Quais ações você viu aí que poderiam ser adotadas também no Brasil?
GABRIELA: Isolamento. Mas esta questão é difícil pois são realidades muito diferentes. No Brasil, onde 80% vivem em áreas urbanas sem muito planejamento, com até 20% desta população em favelas, fica complicado pensar em um plano de isolamento ou “lockdown”. Mas seria necessário um poder público atuante que integrasse esta população aos cuidados necessários nesta hora.
IMD – A educação da população contribui para o controle da pandemia?
GABRIELA: Sem dúvida, o comportamento das pessoas é fundamental para o controle de qualquer doença infecciosa. Seja como o coronavírus, transmitido de pessoa pra pessoa pelo ar, ou arboviroses, como dengue, que também precisam de uma atuação da população no controle. Cada um é, sem dúvida, responsável pelo próprio bem estar e do próximo, mas é necessário também a atenção e atendimento à saúde que a população tem direito e que o Estado deve prover.
IMD – O que mais chamou sua atenção nessa experiência vivida fora do seu país?
GABRIELA: Como as pessoas respeitam regras aqui e sem muita flexibilidade. Além disso, ficou muito mais acentuado como os países parecem distantes em suas culturas, ações e modos de agir e pensar de parte das populações.